domingo, 23 de janeiro de 2011

O SUS REAL

CAIR NO SUS REAL – Gilson Carvalho

Muitos têm me perguntado como chegamos a este SUS ilegal que se distanciou tanto daquilo que foi defendido na CF e na Lei Orgânica de Saúde. Onde ficamos nós? em que curva de caminho? Nós outros que, inicialmente, estávamos cheios de entusiasmo. Consistíamos num movimento coeso com vários grupos engajados nele, onde diferenças naturais eram compensadas pela concordância num núcleo duro comum!!!

Vou repetir aqui uma análise que tenho feito em meus momentos de reflexão. Implantar o SUS real, com base no SUS legal é uma construção extremamente difícil. Dissociar a teoria, a filosofia, da prática da atenção à saúde tem sido quase que um lugar comum no público e no privado. No público por todas as dificuldades sabidas e havidas. No privado pela contradição econômica intrínseca entre tudo dever ser feito para evitar a doença e só se ter compensação financeira para o tratamento das doenças. Defender a saúde, antes de se perdê-la, é o maior fato antieconômico.

No sistema público construímos objetivos, princípios, diretrizes. Copiamos e adaptamos propostas de outros países com toda uma teoria que as embasavam. Depois aprovamos na CF e na LOS… e estragamos nas malfadadas portarias! Onde foi que faltou pernas? Onde perdemos o pé? Quando desviamo-nos e nos distanciamos dos caminhos?

As pernas (ponto de apoio) faltaram na hora da tradução desta teoria em prática. Cansei-me de ouvir e ver atitudes de muitos amigos e aficionados pela filosofia do SUS que, em determinada hora, nas mazelas da gestão codidiana, perderam o pé. Era como se dissessem: “Isto da aplicação no dia a dia é complicado demais. Destas coisas não quero nem entender. Só de ouvir debates já dá canseira.”

Esta é a menos pior das atitudes. A pior mesmo é ouvir críticas a quem está pegando o boi a chifre para fazer acontecer. Muitos destes vem sendo carimbados por aqueles como “os que só querem saber de financiamento, de tabela, de PAB fixo, das caixinhas”.

O SUS real tem que ser feito com financiamento; com tabelas remuneratórias de ações e serviços (as tabelas são a imprescindível base financeira para se tentar fazer algum contrato global – contratualização!!! Não há contratualização justa que não tenha base no estabelecimento do valor dos procedimentos – tabelas); com regulação da atenção; com escalas de trabalho e de plantões; com protocolos e rotinas de serviços; com valorização prática e não teórica dos trabalhadores da saúde; etc. etc. Isto é parte essencial de aplicação de objetivos, princípios e diretrizes!

Vamos nos juntar todos os da Reforma Sanitária e fazer um mea culpa de como cuidamos e tratamos deste SUS. Só com filosofia ou também com providências objetivas? É difícil, chato, complicado discutir financiamento, tabelas, remuneração de ações, critérios de transferências? Isto é a “parte suja”, menos nobre da construção do SUS? Não dá títulos, prêmios e pontos, nem progressão docente, muito menos se conseguem recursos de agências financiadoras igualmente braços dos governos encarregados de fazer acontecer o SUS. O SUS não tem nenhuma chance de acontecer se não mexermos em tudo isto. Impulsionados pela base teórica, mas efetivado pelas providências práticas.

Textos filosóficos lindos, divagações sobre a primeira corda, tratados e teses, só e tão somente, não efetivarão o SUS. É preciso “sujar as mãos” com as medidas práticas, com os enfrentamentos, com as negociações, com os embates políticos de cada esfera de governo.

Tenho medo de que queiramos construir um SUS que apenas seja e pareça bom para nós. Melhor: bom para nossos egos inflados, mais do que deviam. O SUS só será bom se assim for para o cidadão o grande protagonista da saúde. Só será reconhecido pelo cidadão se ele for capaz de oferecer uma boa resposta a suas queixas e anseios. Nem sempre recebendo o serviço que ele imagina ser bom e necessário, mas sempre respeitado, entendido e tendo uma resposta que o atenda e satisfaça.

Meu apelo é para que a gente caia na real. Filosofe menos e coloque mais a mão na massa em todas as etapas julgadas como “menos nobres” do trabalho. Precisamos de produção científica (acadêmica ou não) que ajude a encaminhar: financiamento, custos de ações e procedimentos, protocolos e rotinas de atendimento, gestão de pessoas (formação, aperfeiçoamento, plano de cargos etc), enfrentamento da insuficiência de ações e serviços manifesta nas vergonhosas filas principalmente das urgências, etc. etc.

Este é um chamamento a todos os brasileiros que vêm construindo uma Reforma Sanitária que garanta o direito à vida-saúde das pessoas. Precisamos de todos. Todos nos ajudando a cairmos no SUS REAL! O SUS nosso de cada dia que não pode ser bom apenas para nós aficionados profissionais, técnicos e históricos reformadores sanitários, mas, para todos os seres humanos, cidadãos e políticos de nosso Brasil que não podem mais se alimentar apenas de objetivos, princípios e diretrizes filosóficos de um sistema de saúde. O Brasileiro está atrás de um SUS que lhe ofereça a melhor resposta técnica e humana à guisa de ajuda na conquista da vida-saúde-felicidade.

2 comentários:

  1. DR. GILSSON:
    MEUS APLAUSOS DE PÉ!!!!!!!!!!!!!!!!!

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  2. Faço minhas as palavras do coméntário acima.
    Muito bom o texto...ampliou meus horizontes sobre o SUS no Brasil.

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